terça-feira, 3 de março de 2009

Carta a uma amiga que os tempos afastaram

Certa noite voltávamos de alguma de nossas várias reuniões, era tarde e eu, para variar, estava com fome. Conversávamos no carro e comentei que eu não gostava muito de hambúrgueres e esse tipo de comida. Menos de cinco minutos depois, decidindo aonde ir, vc sugere hambúrguer no Joakin`s. Aquilo não me incomodou, divertiu-me até, pois havia o afeto. Eu sabia que vc não podia me ouvir, talvez ver, pois o tempo a ensurdecia... A presença jamais era satisfatória, vc sempre precisava estar em outro lugar, em outro tempo, mesmo que seus olhos estivessem voltados para mim. Eu conhecia isso, mas havia o afeto, até me divertia e gostava de acompanhá-la nesse frenesi sem razão. Hoje, lembrei-me desse episódio e o que veio foi uma sequência de sentimentos, a saudade, a nostalgia, a tristeza...
A saudade existe com a esperança do retorno, a esperança de reencontrá-la; a nostalgia é a agridoce lembrança do que foi e não mais será e a tristeza é o que resta hoje, pois vivemos em tempos distintos. O afeto, afeto intenso nascido do acaso, do encontro, mostrou-se volúvel e transmutou-se em tristeza nesse intransponível lapso. São dimensões distintas de tempo, um tempo tirano, despótico que organiza e manipula nossos corpos para além da nossa vontade. O tempo das reuniões inadiáveis, dos compromissos inapeláveis, dos projetos pendentes. O tempo finito que escraviza para dar sentido ao que não podemos suportar.
Conheci outro tempo recentemente, queria que você soubesse, o tempo que se fragmenta, se divide ad infintum, cada fragmento pode ser a metade do anterior, é um tempo que se expande eternamente para dentro. É o tempo no qual cavamos os buracos, lembra do buraco de que falava Desnoes? Ninguém tem tempo mais para cavar buracos, dizia. Mas quando se cai no buraco, não resta mais que cavar. Com minhas unhas enfraquecidas, arranho as paredes de barro úmido para subir. Entre as unhas e a pele dos dedos, os resquícios, a saudade, a nostalgia e, enfim, a tristeza. Penso, então, em deixar na portaria de seu prédio os seus livros que estão comigo, inumar nas mãos do porteiro o afeto que eu não queria ter tido e tive. Penso, também, em deixar esta carta com eles, imaginando que você não terá tempo de lê-la ou na esperança de que se a ler poderá ignorá-la e agir com a indiferença que o tempo nos permite ter.

4 Comentários:

Às 3 de março de 2009 às 06:11 , Anonymous Anônimo disse...

sentir afecto por una persona es un sentimiento hermoso, aún cuando la otra persona no corresponda de la misma manera, el afecto sentido, con el tiempo, perderá el color del dolor de lo no correspondido. Al final, los afectos nos alimentan y si el receptor no lo acoge, es él que sufrirá de inhanición. Cuando el tiempo pasa qué más somos si no un valle sembrado de nostalgias, saudades, lembranças. Vale el momento, vale.
Elsa

 
Às 3 de março de 2009 às 19:44 , Anonymous Anônimo disse...

Belo.

 
Às 4 de março de 2009 às 17:02 , Blogger Luciane Godinho disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
Às 8 de março de 2009 às 11:27 , Blogger hugo disse...

Aprendí en su día aquello de que nada de lo humano me es ajeno… y el sentido que creí que tenía servía para comprender las actitudes de otras personas. Sin embargo creo que también puede tener el significado inverso: uno quizás también forme parte de todo eso y no está exento de quedarse en los límites de sus miedos, poquedades y miserias.

Lo que te quiero decir es que entiendo tu dolor ante el ninguneo, entiendo que quieras actuarlo y que lo hagas. Hay situaciones que ponen a prueba a la gente y son una criba: sólo quedan los más auténticos. Lo que quiero decirte, en resumen es eso: que te entiendo…

El momento del “negocio” con el ancho mundo volverá y ahí estarás de vuelta en tratos con gente diversa (como decía Cattone en Scipione: es el momento de la gente picola) pero siempre te acordarás de los que no se fruncieron cuando tocaba. Como decía Goytisolo: “la vida es bella, ya verás…”
Un abrazo. Hugo.

 

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